Era imediato. Quando me falavam desta cidade, era isto que me vinha à
cabeça: cinzento. As poucas vezes que passei as pontes sobre o Douro parecia
ver um véu espesso a impedir a passagem de luz, mergulhando a cidade numa
escuridão leve. Desta vez, sacudi as ideias feitas e coloquei o meu olhar mais
atento. Cinzento? Nada disso. O Porto vibra de cor.
O céu nublado e os chuviscos
intermitentes não auguravam um dia fácil. A ideia da atmosfera cinzenta
colava-se na minha mente. E por ser a terceira vez que percorria o centro do
Porto em busca de um lugar para estacionar, o cinza adensava-se cada vez mais.
Decidida a não me deixar vencer pelo mau-humor meteorológico, dou mais uma
volta ao quarteirão e tenho sorte. O Sr. Fernando, de barba grisalha e ar
maltrapilho, mas de certeza enviado pelos anjos, tinha um lugar reservado para
mim. Agradeceu amavelmente a gorjeta, enquanto apontava para a fachada branca
da reitoria da Universidade, sobranceira à rua das Carmelitas, onde ele costumava
cirandar.
Foi nesta rua que comecei a volta
pela cidade, seguindo em direcção à Cadeia da Relação. De soslaio reparo na
brancura da Igreja dos Clérigos, debruada de pedra, antes de atravessar as
abóbadas da cadeia, actualmente a morada do Centro Português de Fotografia.
Também aqui me deparo com o Branco, castigado por um amor de perdição. Camilo
(Castelo Branco) abraçou estas paredes roídas pelo tempo, enquanto criava o
destino de Simão e Teresa. Respiro as últimas partículas das memórias que por
ali flutuam e sigo por um destino diferente, em direcção à Vitória.