sexta-feira, 29 de agosto de 2008

Tumor no cérebro… ou talvez não

Uma menina timorense de 10 anos foi operada para remover um tumor no cérebro na passada segunda-feira (25 de Agosto), no Hospital de São João do Porto. Felizmente, tudo parece estar a correr bem e a recuperação excede as expectativas. Mas não é propriamente sobre esta menina timorense que eu quero escrever, apesar de ficar muito satisfeita com a notícia. Há outras histórias como esta em Portugal, uma das quais eu fiquei a saber em primeira mão.
No ano lectivo de 2003/2004, dei aulas ao ensino básico em Peniche. Numa das minhas turmas do 8º ano, havia uma aluna muito especial; tinha dificuldades de aprendizagem devido a problemas sérios de visão e perturbações nas funções motoras. Estas dificuldades foram o resultado de um tumor no cérebro, extraído quando ela tinha 8 anos, mas que lhe deixou algumas mazelas. Para ela, os testes tinham objectivos diferentes (chamados objectivos mínimos), os documentos distribuídos eram apresentados em A3, entre outras condições que nós, professores, e a escola tínhamos a obrigação de lhe providenciar (e muito bem). Mas o mais impressionante era mesmo o esforço que ela fazia para acompanhar as aulas, para aprender. E foi com grande orgulho que, num teste que ela fez muito semelhante ao dos colegas, lhe dei nota positiva com todo o mérito. É claro que aproveitei a ocasião para “dar nas orelhas” aos alunos preguiçosos da turma e utilizei esta oportunidade para elogiar a enorme capacidade de sucesso de quem tem, à partida, mais dificuldades, mas também uma grande força de vontade. Lembro-me do brilho dos olhos dela e do sorriso radioso com que ela presenteou toda a turma. Tenho a certeza que esta aluna muito especial vai ser bem sucedida!

terça-feira, 26 de agosto de 2008

Peixe? Nunca mais…

Estou a ler um livro muito interessante. Chama-se “O Homem, a Orquídea e o Polvo” e narra a vida e as ideias de Jacques Cousteau, um explorador cujos documentários acompanharam a minha juventude. Numa das passagens do livro, sobre a pesca a nível mundial e o saque aos recursos do mar, revi a minha cara de espanto de há 5 anos atrás, quando estava de férias na Indonésia com alguns amigos, incluindo nativos, e onde me apercebi de (mais) uma realidade dolorosa.
No livro fala-se em estatísticas: “O peixe garante mais de 50% das proteínas animais dos povos do Chade, da Costa do Marfim, da Jamaica, da República da Coreia, da Malásia, do Mali, do Senegal e do Uganda; no Congo, no Vietname e na Indonésia as pessoas estão dependentes do peixe para obter, pelo menos, 60% do seu consumo de proteínas de origem animal (…) o peixe garante-lhes uma percentagem muito grande de proteína não porque tenham à sua disposição muito peixe para comerem, mas porque não têm mais nada para comer.”
Na viagem que fizemos pelas ilhas indonésias nós, europeus, queríamos experimentar todas as iguarias e os sabores exóticos que as acompanham. Um dos nossos amigos indonésios comia diferente cada vez que a refeição incluía peixe. Perguntámos-lhe se ele não gostava de peixe, de qualquer um, e ele respondeu que não comia peixe porque peixe era a única coisa que o pai lhes podia dar para comer, a ele e à restante família, quando eram pobres. Foi uma infância e uma adolescência a comer (só) peixe. Ele não conseguia comer mais peixe, agora que tinha a possibilidade de comer outras coisas. A minha cara de espanto formou-se nesta altura, quando me apercebi de uma das injustiças do mundo - o não poder escolher o que comer - e do quão privilegiada eu sempre fui.

Portuguese man of war found at Peniche beach

One of the first news of the day was the appearance and supposed attack of a blue bottle, a kind of jellyfish, over 2 children, at Peniche, a beach located in central Portugal. The blue bottle (Physalia physalis) is also known as Portuguese man of war (Caravela Portuguesa), due to the shape similarities with the triangular sails of this ship. It is called blue bottle because it is coloured with a translucent blue.
It is strange that it appears around here. Peniche's seawater is not particularly warm to attract these marine invertebrates. One of the lifeguards of the area said it was the fifth he found in the last 2 years… Something is changing, it seems.
The first time I saw a blue bottle was at Wollongong city beach, in February 2005. Me and my English friend wanted to have a swim after work; it was 4 pm when we arrived at the beach and when we got there, hundreds of blue bottles were laying on the sand, breathing slowly and waiting for the tide to rise again and take them back to the ocean. It was a scary scenario… but we went for a swim anyway, thinking that, since many blue bottles were on the sand, less would be in the ocean. It was a 3 minutes swim… the risk of being stung haunted us.
In the following months, I had other encounters with blue bottles, the funniest one when I went for a swim at 7 am on the natural pool; the tide was high and a couple of blue bottles decided to cross over the stone wall of the pool (which separated it from the sea) to swim with me… but I just ran off. Sorry mates, you’re just too dangerous.

http://en.wikipedia.org/wiki/Portuguese_Man_o'_War

Momentos na Galé

O nosso estaminé...

A praia privada...

Os viciados...


O frio ao pôr-do-sol...

Este pôr-do-sol...

O regresso por Tróia...

E as gargalhadas, o hamburguer à ceia, o cansaço, as ondas que dificultavam a entrada no mar, os pic-nics, a camaradagem, o espírito de grupo. Nós...

terça-feira, 19 de agosto de 2008

"Helper of Humanity"

Em grego, o meu nome significa “ajudante da humanidade”. Se calhar a escolha do meu nome não foi por acaso. Aprendi a gostar dele, mesmo sendo muito pouco original. Este nome estava destinado à rapariga que devia ter sido o meu irmão mais velho, não tivesse ele enganado a minha mãe e saído um rapaz. Quando chegou a minha vez, a minha mãe pensava que eu seria igualmente um rapaz, como se fosse um castigo por não ter tido a menina primeiro, não teria nenhuma. Outro engano. Apareci eu, no Dia das Mentiras. Mas um nome diferente para menina ficou por escolher e acabei por ser registada com o “Sandra Isabel” que pertencia ao meu irmão, graças ao meu pai que me registou antes da minha mãe sair do hospital e antes dela ter tempo e paciência para escolher outro nome.
Finda a aventura do meu nome, começa a saga da minha vida. Será que estou destinada a fazer algo que ajude a humanidade?

This is the meaning of my name in Greek. Am I destined to do something that helps mankind? Just a thought, now that I'm on holidays and I have nothing better to do...

segunda-feira, 18 de agosto de 2008

A primeira janela para o mundo

Há alguns dias atrás recebi uma mensagem de uma amiga que ia a caminho da Holanda, que ela designou de forma certeira como a nossa “primeira janela para o mundo”. A Holanda foi o primeiro país estrangeiro que realmente conheci e onde a semente de exploradora/viajante começou a germinar.
Aos 16 anos, participei no Jamboree Mundial para pioneiros, realizado em Dronten, Flevoland. Mas esta aventura de duas semanas não conta porque estávamos num “país” à parte, criado para nós, escuteiros de todo o mundo. Do país Holanda propriamente dito lembro-me de muito pouco dessa altura (lembro-me sim da cerimónia de abertura, do pórtico de caravela que construímos, do slide sobre o rio, do meu namorado americano e do urso de peluche que ele me ofereceu, baptizado de Pedro por uma colega da Costa Rica, dos fogo-conselho internacionais, do hino “I’m from the future” que ressoou nas nossas guitarras e vozes durante os anos seguintes e da choradeira em frente ao autocarro na hora de regressar).
Conheci bem melhor o país Holanda durante os 7 meses que lá vivi enquanto estudante Erasmus. No dia em que eu e a minha amiga lá chegámos sentimos desde a excitação ao desespero. Era final de Agosto do ano 2000 e estava um calor abrasador em Portugal; em Utrecht, a cidade para onde nos mudámos, também estava calor; fomos directamente para os serviços internacionais onde a minha amiga tinha que ir buscar a chave do seu quarto, mas mandaram-nos aos correios para pagar a renda primeiro. Deixámos as bagagens nos serviços e seguimos para os correios onde tratámos do pagamento, mas a nossa (má) orientação no caminho de regresso levou-nos pelo caminho mais longo e quando finalmente chegámos de novo aos serviços, depois de uma molha descomunal – o calor transformou-se em chuva - e de passarmos em frente ao edifício em U invertido que a minha amiga achou horrível, afirmando convictamente que não gostaria de morar ali, “batemos com o nariz na porta”, com as nossas bagagens e a chave de casa da minha amiga fechadas lá dentro. Estávamos num país estranho, perdidas, sem bagagens e sem casa.
Ahhhhhhhhh! Desespero!
Pensámos em telefonar para o 112, mas não iria resolver nada. Pensámos em dormir numa pensão, mas os florins eram poucos (ainda não tínhamos o Euro). De repente lembrei-me que tinha o contacto da casa que eu iria partilhar com holandeses… e ligámos. Do outro lado da linha, depois de eu me apresentar no meu inglês enferrujado, responde-me uma voz: “Pode falar português, eu percebo, minha mãe é brasileira”. A salvação desceu do céu em sotaque brasileiro, juntamente com as indicações para chegar à minha casa, toalhas e roupa de cama emprestadas e um sorriso que nos encheu de esperança. A aventura tinha acabado de começar.

Foi aí que aprendi a apreciar as coincidências. Foi aí que aprendi que todas as peripécias nos ajudam a crescer e a resolver problemas, no momento ou no futuro. A primeira janela para o mundo tinha acabado de se abrir, depois do esforço inicial...

Ah, é verdade; no dia seguinte, depois de recuperarmos as bagagens, seguimos para a casa da minha amiga, a horrorosa casa em U invertido que tínhamos avistado no dia anterior… Acabou por ser um óptimo abrigo e um bom local para festas temáticas. Cambridgelaan 241 foi um verdadeiro sucesso.

Obrigada Bernardete, por todas estas aventuras que temos partilhado!

domingo, 10 de agosto de 2008

"E se um nativo de Salamonde te oferecer uma rosa?" E outras aventuras no Gerês

O Gerês é conhecido pelas cascatas, pelas barragens, pelos lobos, pela vegetação frondosa e por ser a única área protegida com estatuto de Parque Nacional no país. Após um fim-de-semana com os bolseiros (e companhia) do CEG UL, o Gerês passou também a ser:

a aldeia de Zebral e as aldeias nas rechãs;
os saltitões Kiko e Spot e as histórias do avô ao Domingo de manhã;
as águas reluzentes e os retalhos verdes nas montanhas;

a libelinha azul, os garranos, as vacas Barrosã e o lagarto fotogénico da Pedra Bela;




o pó dos caminhos de terra batida, o pedregulho no meio da estrada e a tentativa frustrada de o remover;



a cama macia das raparigas e o chão do sótão (e o ressonar) dos rapazes;
as canoas na Caniçada e as aventuras nas bóias;
as salsichas picantes, o almoço-pizza das 16h, o bolo de chocolate, o gelado de Oreo e a deliciosa lasanha sem carne;



as guitarradas nocturnas, o som aborígene do didgeridoo e a sala transformada em discoteca;



as lições de salsa, merengue e funaná ao ritmo da paixão da Cris;
a caipirinha antes de jantar e as minis até o sol nascer;
a Ana Malhoa que não vimos, o baile roqueiro, a “ave depenada” no meio do palco e a “Sóninha” do Mértola;

uma rosa oferecida por um nativo de Salamonde;

a água gelada a cair sobre os ombros e o almoço à beira-rio;
a vista do topo das antenas e o espreguiçar no tejadilho;
o jogo do gratinado, a fila para o duche e os atrasos sem discórdias;
o cheiro a menta e as plantas invasoras;

os sorrisos, a camaradagem, a descoberta dos outros e a liberdade de sermos nós.

Obrigada a todos!







Bolseiros e companhia no Gerês





The best idea I ever had

This is a text I wrote one year after I returned from Australia, in one of those occasions I felt the extreme need to communicate somehow. I read it again, 2 and half years later, and I still find myself in these words, even though some things have changed. I’m no longer melancholic nor do I feel empty anymore. I do miss the people I left behind, the places I lived in and the wonderful sensation of being a “free spirit”, with all the good and bad it brings. Many things happened since then but I still feel that going to Australia was the best thing I ever made, because it showed me, among other things, how to handle and live with myself.

9th March 2006. I’m sitting in front of the computer trying to put in words all the feelings that invade me. I listen to the voice of Paul Greene, the Australian singer that has been my company in the melancholic hours. Australia was an adventure that satisfied me in every sense and it was a place where I really felt at home.
It’s been a year today that I returned to Portugal, to the world I have always known and that I trade for another one, a distant one. I feel melancholic, as in many other days since I returned. In the first months, I felt the need to touch in things I brought from Australia, to see the faces of the people, to remind myself of what I have done there. The sensation of emptiness still haunts me, because the memories hide in my brain and I desperately try to bring them back to the surface. I know I won’t loose them, we don’t loose what we learn, but to come back to a different world like this I’m living now makes me diverge from what I found out to be in Australia: a bit hippie, a successful communicator, a liberated person and a free soul. An incorrigible dreamer with a huge willpower to change the world and the conviction I could really do it. I feel limited here, as if the wings have separated from the body when I returned to the nest. Here I tend to be more of what the others think I am, to be more normal. I haven’t been wearing the hippie pants Mary gave me for a long time, even being the ones I like the most. I look normal, but I feel very different. One thing is for sure: going to Australia was the best idea I ever had, and hopefully it won’t be the last. The world - and what we can learn from it - is just too big.

3 and half years have passed since I returned. The wings are growing again.










Pele de foca

No dia 23 de Julho passado, a Comissão Europeia lançou uma proposta para regulamentar a comercialização de produtos derivados de focas, sugerindo a proibição de produtos resultantes de mortes dolorosas e cruéis.
Todos os anos, em Fevereiro, centenas de caçadores reúnem-se no Canadá e perseguem as focas que nasceram há poucos meses, ainda de pêlo branco. As focas são mortas à paulada e esfoladas no local, deixando as carcaças ensanguentadas no local. Por vezes a paulada só chega para as atordoar e a pele é retirada enquanto o coração das focas ainda bate, porque a competição é grande e o governo canadiano só abre a caça durante alguns dias. 300 mil focas bebé morrem todos os anos para alimentar um mercado parco e pouco rentável.
Todos os anos, por esta altura, fico assombrada com a crueldade que o ser humano é capaz de infligir. Não é pelo facto de caçar e criar animais para comer, isso não me choca. Carnívoros comem herbívoros, diz a ciência. É caçar e criar animais com métodos impiedosos, como se ainda acreditássemos que os animais não sentem dor ou fingimos que isso não importa. É matar animais dos quais não se depende para sobreviver, mas porque se gosta de vestir roupa de uma pele específica (chinchila, arminho ou vison), porque se gosta de usar uma pulseira ou ter um enfeite de marfim em casa (elefante) ou simplesmente porque se gosta de caçar.
Não ponho em causa a necessidade de o fazer em situações específicas. Os Inuit dependem das focas e das baleias, algumas populações restritas em África dependem do turismo de safari. Quem tem fome e não tem outra alternativa, caça o que houver. Mas os canadianos, dinamarqueses, finlandeses, suecos e americanos precisam disso? O rendimento que esta caça lhes traz é imprescindível para o seu agregado?
Uma das justificações utilizadas baseia-se no facto desta actividade fazer parte da cultura do país. Uma tradição que se deve manter porque pertence à identidade de um povo. Assim como nós evoluímos como pessoas ao longo do tempo e alteramos os nossos comportamentos consoante as nossas preferências e necessidades do momento ou idade, também a cultura sofre este processo de evolução, numa escala de tempo mais prolongada. A cultura evolui porque cada um de nós tem a possibilidade de escolher, mesmo que por vezes de forma limitada pelas ingerências e normas da sociedade. Escolhemos o que faz mais sentido e aquilo que mais nos preenche enquanto seres humanos, enquanto pessoas, acrescentando um pouco de nós a esta cultura que, afinal, tem sido construída ao longo do tempo por pessoas como nós.

http://www.ifaw.org/ifaw/general/default.aspx?oid=21446