“Do you speak
English?” O senhor sentado ao meu lado no avião meteu conversa; o boné preto
enfiado na cabeça, jeans, pólo branco às riscas azuis e ténis a condizer
contrastavam com a tez escura de Gabriel, um ganês sediado em Bilbau há 15
anos. Encontrámo-nos no avião em Lisboa com destino a Acra, a capital do Gana, país
onde estou a implementar o trabalho de campo nas plantações de cacau. Gabriel
conta-me que chegou a trabalhar um ano numa plantação de cacau, quando lhe digo
o que vou fazer ao Gana. A simpatia ganiana persegue-o e conversámos grande
parte do voo; actualmente desempregado depois da fábrica de lingotes de prata onde
trabalhava ter fechado, Gabriel decidiu passar 2 semanas de férias na cidade
costeira de onde partiu inicialmente para Modena, na Itália, há quase 2 décadas,
onde viviam 2 dos seus irmãos. Depois foi visitar um amigo em Bilbau e, sem
planear, foi ficando por Espanha, onde não quer ficar para sempre. “Tenho que pensar
bem e preparar as coisas, regressar ao Gana sem trabalho é mau, não serve. Mas
quero voltar.”
O voo vai
atrasado mas corre sem peripécias. Da janela vejo as fatias coloridas do céu
quando se aproxima o pôr-do-sol, emolduradas por tufos de nuvens. Nos trópicos
as nuvens abundam, apesar de ser agora estação seca e não haver sinal de chuva.
Chegamos a Acra às 10h da noite e estão uns maravilhosos 28 graus! Pedem-me o
passaporte 3 vezes antes de chegar ao tapete rolante das bagagens, na última
vez o rapaz sorri abertamente e diz-me que o nome Sandra é muito importante
para ele. Será a namorada? Uma paixão arrebatadora? Uma mentirinha para se
armar em engraçado? Não chego a descobrir, mas alegro-me pelo meu nome ser
apreciado também aqui nos trópicos, seja qual for a razão.
O Hotel Esther
onde fico alojada fica a 5 minutos do aeroporto, escondido numa rua
residencial; tem um ar colonial, de piso térreo e plantas frondosas à porta. No
quarto, em cima da secretária de madeira velha, vejo um bloco de notas onde os
funcionários apontam as bebidas disponíveis no quarto. Reparo que afinal é um
caderno de escola primária, de uma colecção intitulada "Football
legends". Na capa surge aos meus olhos a figura jovem de um conhecido jogador
português, no auge da sua brilhante carreira no campo. Conseguem adivinhar quem
é? Não, não é o Cristiano Ronaldo, ele é muito conhecido e basta dizer que sou
portuguesa para o seu nome vir à baila, juntamente com o brilho nos olhos escuros
dos jovens africanos. Mas o verdadeiro embaixador de Portugal no mundo na última
década é o Luís Figo, figura incontornável do futebol português que encanta
crianças e jovens em África e na Ásia; já em 2003 o Figo era o meu conterrâneo
mais aclamado na Indonésia quando revelava de onde vinha, enquanto que Xanana
Gusmão, que sofreu anos na prisão por defender a independência de Timor-Leste
da Indonésia e a aproximação às raízes portuguesas, mal era mencionado. Assim
se vê que é o futebol que move o mundo, bem mais do que a política.
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