terça-feira, 22 de novembro de 2011

Nápoles


Detestei Nápoles da primeira vez que lá passei, há uns anos atrás. Exactamente naquele dia a equipa de futebol da cidade tinha ganho o jogo e com isso subiu de divisão, o que se traduziu em festa... ou melhor, numa algazarra tal que os transportes públicos pararam e as estradas encheram-se de adeptos vestidos de azul e branco e de vespas (motorini) buzinantes. Ora, quem queria ir do porto até à estação central tinha que ir a pé, arrastando a mala pelas pilhas de lixo e evitando por milímetros ser atropelada por um dos motorini. Razão suficiente para não gostar daquela cidade.
  
 

A segunda impressão, este fim-de-semana, foi diferente. Continua a ser a cidade caótica que se espera, a estação central é uma bagunça, o trânsito infernal, o lixo amontoa-se junto aos caixotes. E há pessoas estranhas que te miram de alto a baixo de forma assustadora. Mas há uma autenticidade mediterrânica que não se encontra nas cidades do norte de Itália; a verdadeira Itália - a mesma do filme "Gomorra" e "Benvenuti al Sud", vive nas ruas estreitas de prédios sem reboco onde os vizinhos partilham o estendal de parede a parede, nas pessoas bonitas de tez escura queimada pelo sol e olhos claros, na simpatia dos locais de sotaque cerrado e "sch" como o português, e na "vera pizza napolitana", naquela pizzaria que a Liz do livro "Comer, Orar, Amar" tornou ainda mais famosa e onde o tempo de espera ultrapassa a hora ("Da Michele", caso queiram saber).

 
Tempo de espera para experimentar a pizza napolitana no local mais antigo de Itália
Em Nápoles descobri ruas cheias de presépios, uma verdadeira arte local, e muitas lojas de vestidos de noiva, feitos à medida para os VIP que lá vão. Visitei ruínas medievais e romanas, escondidas nas catacumbas de uma basílica. Descobri o Babá (yummy), a Sfogliatella  e aprendi a fazer limoncello, para um dia experimentar.

Nas catacumbas romanas da Basílica de São Lorenzo Maggiore
Figuras de presépio originais: o pizzaiolo, a padeira, o lenhador...
Babá, massa tipo pão-de-ló (chamam-lhe pan di spagna) com rum e creme de limão


quinta-feira, 10 de novembro de 2011

A imaginação dos ladrões

Imaginem o que é chegar a casa e descobrir que alguém desconhecido entrou, remexeu e levou. O anel de ouro, o computador portátil, a máquina fotográfica, a moldura digital, o telemóvel já não estão no sítio do costume... É uma sensação terrível, que faz a revolta crescer. A nossa casa revirada do avesso, o nosso porto de abrigo ocupado, a nossa história pendurada das paredes e espalhada pelos objectos da casa à mercê de um desconhecido, a nossa privacidade violada... 

Aqui em Ispra e arredores, infelizmente, há muitas pessoas que podem partilhar esta sensação, eu incluída. Não tem a fama de Nápoles ou da Sicília, mas as estatísticas não são favoráveis. Ontem, em 25 minutos, o ladrão partiu a janela dupla da casa, revirou o quarto, a casa-de-banho e a sala com as mãos enfiadas em sacos de plástico para não deixar vestígios e teve que fugir pelo jardim e saltar a cerca quando ouviu a dona da casa chegar, mais cedo do que esperava. Só teve tempo de pegar na máquina fotográfica escondida na estante dos livros e sair pela janela por onde entrou, partindo as luzes do jardim no caminho para não ser visto. A dona da casa, ao reparar na janela danificada, liga para uma amiga a pedir ajuda, acreditando que o ladrão ainda pode estar em casa porque o tempo que ela esteve fora não parecia ser suficiente para tanto estrago. E entram ambas corajosas em casa, com uma vassoura na mão prontas para dar umas pauladas nas costas do atrevido. Não, o ladrão já não estava em casa e a dona da casa lembrou-se então que o seu cão, quando chegou a casa com ela, correu como uma flecha para o fundo do jardim. Não sei se ele teve algum encontro imediato com o intruso, mas mesmo se tivesse tido de certeza que a doçura deste cão não lhe iria morder como ele merecia... há cães que não são feitos para guardarem uma casa.

Feitas as primeiras vistorias para verificar o que está fora de sítio, chamam-se os Carabinieri. Chegam surpreendentemente rápido, poucos minutos depois, entram pelo portão e ao verem o cão, diz um deles: "Tenha cuidado com o cão porque ele pode sujar a farda"... sim, é nisso mesmo que pensamos quando a nossa casa acabou de ser roubada, na limpeza da sua farda. Vêem a janela partida e dizem "Che bravi ladri"! Sim, de facto merecem um elogio por terem destruído uma janela alheia. Olham para a desarrumação da casa, observam a janela e fazem algumas perguntas, um deles senta-se à mesa para preencher o auto enquanto o outro verifica o jardim e a cerca por onde suspeitamos que o ladrão tenha fugido. Entretanto a pergunta ingénua: "E impressões digitais, não tiram? - A senhora anda a ver muitos filmes", responde um deles. No final acabaram por levar um pedaço do vidro da janela onde se viam umas dedadas e um dos sacos de plástico que o ladrão usou para remexer as coisas, provavelmente só para nos impressionar.  

Os casos de furto nesta terra escondida nos Alpes sucedem-se. O pior episódio foi contado por uma colega espanhola cuja casa foi assaltada enquanto ela estava a dormir. Naquela noite os ladrões decidiram assaltar três casas daquele condomínio. Pegaram na broca de madeira manual, furaram as molduras das janelas e lançaram um gás para dormir para dentro de casa. Depois entraram pela janela entretanto partida ou arrombada, remexeram a casa, entrando inclusive no quarto onde os moradores dormiam e passando pelo cão adormentado, pegaram no portátil, no ouro, no dinheiro que encontraram e depois saíram calmamente. Numa das casas assaltadas, foram ao frigorífico e comeram e beberam o que lá havia, deixando para trás o lixo. Acordar e perceber que um intruso esteve em tua casa a mexer nas tuas coisas enquanto tu também lá estavas é uma sensação ainda pior. Que fez a minha colega mudar de casa logo que pôde porque, apesar de dizerem que o ladrão nunca volta ao mesmo sítio, a segurança do "nosso porto de abrigo" já não é a mesma.  

Se os ladrões usassem a sua imaginação para coisas benéficas, o mundo seria com certeza um lugar melhor.


sábado, 5 de novembro de 2011

Novo visual

Se passaste por aqui já percebeste que eu, o blog que estás a ler, mudei de visual. Digamos que fiz uma renovação superficial para dar um novo ar a este espaço, mantendo no entanto, intactos os princípios e o tipo de conteúdos que guardo. Porque me apetece transfigurar a minha forma de expressão, uma maneira de reagir às mudanças a que a própria vida me obriga de vez em quando.

Sê bem-vindo a este velho-novo blog!

quinta-feira, 27 de outubro de 2011

Hoje não me apetece

nada estar sozinha. Tenho saudades de Portugal, dos meus irmãos e da minha irmã, da voz do meu pai, das conversas animadas da minha mãe, das gatinhas, do Rex. Tenho saudades de um almoço em família em casa da minha avó, do cheiro a cozido à portuguesa, das gargalhadas espontâneas à mesa quando o meu irmão diz uma piada. Do meu quarto atulhado de coisas e das prateleiras cheias de livros da biblioteca. Tenho saudades do movimento e da alegria de uma casa cheia de gente, onde a privacidade é difícil de encontrar mas nenhum de nós se importa. Queria ter a minha família por perto, assim bem pertinho. E poder aninhar-me no sofá a dormitar ao som das vozes tão diferentes que me rodeiam, sabendo que quando abrisse os olhos eles estariam logo ali, provavelmente a rir-se da minha figura e a pensar como me poderiam roubar o lugar no sofá.

Hoje não me apetece mesmo nada estar sozinha.

quarta-feira, 26 de outubro de 2011

Aprender pela experiência

Hoje aprendi algo importante. Graças ao meu chefe que, por motivos de ausência sua, me deixou a desafiante tarefa de apresentar o nosso trabalho a um grupo de parlamentares gregos. Políticos portanto. Com muito poucas noções técnicas e científicas do trabalho que desenvolvemos e, mais importante que isso, normalmente sem o mínimo interesse em perceber. Ok, fazer uma apresentação em público não é problema; algum talento natural, o gosto por falar e os anos de experiência ajudam muito. Mesmo quando tenho que enfrentar os dinossauros do ramo científico em que acabei de entrar sei o que espero e o tipo de questões que me podem colocar. Preparamo-nos mentalmente para isso, faz parte do treino. Com políticos a história é outra. Não os estou a julgar, apenas a constatar o facto que eles não têm que saber a parte técnica do meu trabalho, por isso é o meu discurso que se deve adaptar, devo expor as evidencias científicas que encontramos numa linguagem acessível e útil para o seu trabalho. Também aqui não há problema. São antes as questões mesquinhas e interesseiras que me causam transtorno, aquelas a que devo responder firmemente mas sem os ofender para representar bem a minha instituição, mesmo sabendo que não têm o mínimo fundamento científico ou utilidade prática. E foi o que fiz, claro. Respondendo à ignorância e passando ao lado das provocações. Aprende-se melhor pela experiência a lidar com estas situações.
Enquanto escrevo este texto lembro-me dos investigadores do Centro de Geologia de Roma, agora no banco dos réus por suposta negligência no aviso atempado da população de Abbruzzo antes do terramoto de 2009. E os decisores da administração pública e da protecção civil, o que fizeram para o evitar? Cientificamente é ainda impossível prever com exactidão a ocorrência de um terramoto, embora haja sinais anteriores. É função do cientista avisar destes sinais, como parece ter sido feito, mas a decisão de deslocar a população baseada em suspeitas que só poderão ser confimadas depois do evento ocorrer não é dele. A possibilidade de ser falso alarme é grande e os votos demasiado preciosos para perder com decisões corajosas mas talvez desnecessárias e, certamente, muito incómodas.

terça-feira, 18 de outubro de 2011

Fim-de-semana bom

Sábado, dia de cidade grande. O movimento, a multidão. Entrar em todas as livrarias que vejo e apreciar as novidades e os clássicos, em várias línguas. Comprar aquele livro que procurava há que tempos. Passar por acaso em frente a um Teatro e assistir a um concerto inspirador de piano. Sentir o cheiro de castanhas assadas e dos doces sicilianos. Regressar a casa e desfolhar atentamente os livros novos, as fotografias, o texto em italiano. E partilhar todas estas coisas em português com os amigos que me convidaram para jantar.
Domingo, dia de montanha. Caminhada nos Alpes, para os lados de Macugnaga. O ar fresco que faz o nariz fungar. A vista sobre o Monte Rosa, a montanha mais alta dos Alpes italianos. O sol forte na pele. A chegada ao primeiro poiso junto ao glaciar e o almoço volante.  As cadeiras de ski paradas, esperando pela neve deste ano. O glaciar sem gelo que atravessámos, baptizado de cascalheira lunar. A neve brilhante nos cumes e as ervas amarelas no caminho. O engano no caminho e a persistência para continuar A água gelada do rio. Chegar a casa estafada, mas contente, porque subi uma montanha e avistei um horizonte largo e límpido, sem obstáculos humanos.

 


domingo, 9 de outubro de 2011

Sardenha

 

Gosto de ir a conferências, pela partilha de conhecimentos, pela sensação de pertença a um grupo científico e pela partilha de experiências com pessoas muito interessantes. As noites da conferência foram passadas em confraternização com estes colegas, a experimentar os sabores típicos da Sardenha encostadas à muralha do centro histórico de Alghero e com vista sobre a lua crescente a beijar o mar. Comi porcetto assado no forno, tamboril à moda da terra (monkfish em inglês e pescatrice em italiano), risotto de marisco e as famosas seadas (queijo frito com mel). Bebi Cannonau (vinho tinto), Mirto (licor de ervas) e um Passito sardo (uma espécie de moscatel). Aprendi a letra da famosa música "Bella Ciao", dos tempos da resistência Partisana contra os nazis e do "Cielito lindo" tão cantarolado na vizinha Espanha. Descobri que os homens sardos transportam uma faca no bolso para usar em qualquer ocasião, incluindo cortar o chouriço que nos sorri na mesa. Partilhei momentos de galhofa com a Ambra, a Carmen, a Ilaria, a Marji, o Clemens, o Gonzalo, a Itziar e o Franco, como se nos conhecêssemos há muito tempo. Não, não é o caso, mas a similaridade de experiências de vida aproxima-nos. 


Outra coisa boa das conferências internacionais é a viagem de campo, basicamente uma visita aos locais turísticos mais emblemáticos na região onde se realiza a conferência. Neste caso fomos visitar o Nurague Palmavera – ruínas de uma aldeia muito antiga do povo nuragi (descoberto apenas na Sardenha) composta de uma torre circular e praça de convívio feitas em pedra e madeira ao centro, rodeada de casas pequenas.  Visitámos também o Parco Naturale de Porto Conte e o Capo Caccia, reserva natural de maquis mediterrânico com falésias escarpadas que sobressaem magnificamente sobre o azul transparente do mar. 

Sem palavras :) :)

O Nuraghe

Ainda tivemos tempo para uma visita à quinta de produção de vinhos Stella & Mosca , cujos 650 hectares de vinha se estendem graciosas num horizonte plano e seco. 

 Vinhas a perder de vista

Os dois últimos dias da minha estadia na Sardenha passei-os a conduzir um Cinquecento por paisagens maravilhosas de colinas repletas de tufos de arbustos em escarpas rochosas sobre o mar Mediterrâneo. O tempo de sol e calor dos dias da conferência mudou entretanto para fresco e ventoso. Em Stintini, uma praia nos confins da região noroeste da ilha, o vento empurrava com tal força os grãos de areia fina e normalmente macia contra nós que nos arranhavam as pernas. O mar estava bravo, enrolava ondas que carregavam diferentes tons de azul dependendo da fase de crescimento ou rebentação. Do outro lado, a silhueta da Ilha Piana e da Ilha Asinina, onde habitam os burros (asino) de pelo branco e comprido endémicos da Sardenha.




A vila e a praia de Stintino

Um pouco mais a sul, passámos por Argentiera, terra abandonada e decadente dos tempos das minas de prata (argento), onde meia dúzia de velhotes se reúne no único café existente a meio da única estrada da aldeia e onde anúncios de venda de apartamentos apontam para casas destruídas com vidros partidos e o esqueleto de ferro à mostra.

Argentiera... deprimente

A minha última noite passei-a em Bosa; estava já a escurecer quando cheguei e o centro da cidade não me pareceu nada atractivo. Raios! Depois da estrada panorâmica e das manadas de vacas que tive que atravessar, não me apetecia nada passar a noite sozinha naquele sítio. Avancei mais uns quilómetros e avistei o mar na marina de Bosa, muito mais convidativo para uma passeata nocturna. Fiquei alojada num B&B com vista sobre o mar, uma parte do Rio Temo (o único rio navegável da Sardenha) e 5 lindos cães labrador ainda bebés que conheci na manhã seguinte. Boa escolha! E a luz do sol fez a cidade parecer muito mais bonita, com o castelo sobranceiro e os meandros do rio Temo.



 




De regresso a Alghero, descobri os recantos pitorescos desta cidade, tão catalã na língua e nos costumes. Reza a história que o povo de Alghero se revoltou contra o invasor - os catalães, mas que estes conseguiram expulsar os revoltosos e apenas os catalães podiam lá morar depois disso. Nesta cidade de nome provavelmente árabe, caminha-se na história em cima das muralhas que rodeiam o centro histórico, onde os bastiões se erguem altivos sobre o mar. A marina, enorme, acompanha-se ao longo da marginal onde palmeiras dançam ao vento.



Uma casa tipicamente árabe

A marina

 O bastião e as palmeiras

quarta-feira, 5 de outubro de 2011

Alghero

Noroeste da Sardenha. Lugar de mar, de plameiras, de oliveiras, de figueiras em forma de pata de elefante. Lugar com história, rodeado de muralhas de onde se vê a lua a beijar o mar. Cidade onde se fala o catalão e onde as ruas se chamam "carret" em vez de "via". Cidade turística onde os restaurantes sobranceiros ao mar nos oferecem um copo de vinho branco enquanto esperamos por uma mesa disponível, à moda de Hollywood. Lugar onde se come bacalà (bacalhau), fregola (massa miudinha com marisco) e seada (doce de queijo e mel).

Durante o jantar com companheiras de conferência, falámos das avós, daquelas mulheres cheias de força e coragem que sobreviveram a guerras, a fome, a falta de recursos, à revolução tecnológica e que são uma influência fundamental na nossa vida. Seja em Portugal, em Piemonte ou em Nápoles.

segunda-feira, 19 de setembro de 2011

Histórias de vida dura

Chamemos-lhe Giovanni. Há algum tempo que vagueia pelas ruas de Milão e dorme na Estação Central de comboios, onde outros sem-abrigo se juntam. Não sabe explicar bem como foi ali parar, fala com inquietação da traição da mulher, do divórcio litigioso em que perdeu os dois apartamentos, da filha que anda supostamente pela estrada. É jardineiro de profissão mas na confusão da sua vida pessoal também perdeu o trabalho e com isso, o sustento. Ficou sozinho, miserável, mendigando pelas ruas de uma das cidades mais ricas da Europa do Sul. Perdeu a dignidade e a esperança e tenta suicidar-se diversas vezes, mas é salvo pela polícia.
Um dia, sem o conhecer pessoalmente, há alguém que se interessa pela sua vida, que acha que vale a pena tentar um pequeno gesto e envia um email aos seus contactos a dizer que um jardineiro andava à procura de trabalho. Palavra puxa palavra e sabe-se então que uma empresa de viveiros andava mesmo a precisar de mais um par de mãos. Giovanni é chamado e começa a recuperar a sua vida. Hoje tem um tecto, um trabalho e a sua dignidade de volta. Quando Giovanni conheceu por acaso o rapaz que enviou o email que abriu um novo rumo à sua vida, disse-lhe: "Um dia, quando voltar a ser homem, convido-te para jantar". Hoje foi o dia. E o meu amigo Mauro, o tal rapaz que enviou o email, está neste momento em Milão a celebrar o resultado do seu gesto de bondade. E eu cheia de orgulho e de alegria pela sorte que tenho em encontrar pessoas como ele no meu caminho.

terça-feira, 13 de setembro de 2011

Este fim-de-semana foi

Perugia


camaradagem, festa, conversas disparatadas até de madrugada... dança grega e tarantela, cantar o Malhão depois da meia-noite, o som do acordeão vindo de Portugal... os últimos a sair da festa, como de costume, depois de acabarmos o limoncello. Foi cocktails de prosecco com sumo de fruta entre conversas em 3 linguas diferentes, passeios pela cidade etrusca e a descoberta frustrante de que em Itália também há maus gelados. Noites de lua cheia passadas num Agriturismo bucólico onde os donos recebem cães abandonados. Convívios em família com vista sobre a cidade onde o Verão se prolonga, o à-vontade entre amigos e as gargalhadas genuínas de quem gosta de estar naquela companhia. Este fim-de-semana foi de visita rápida às cores da Toscânia e à terra do vinho Montepulciano, numa viagem programada para celebrar o amor sem fronteiras e onde se aprendeu também a amizade sem nacionalidade.   

Paisagem Toscana, em Montepulciano



terça-feira, 6 de setembro de 2011

Uma vida cheia

Saí da festa a flutuar, com a tranquilidade de saber que não estou sozinha no que sinto e no que vivo. A vida tem-me sido generosa, de facto. Tenho uma vida emocionante rodeada de pessoas fantásticas, incluindo as que estão fisicamente longe. Com algumas delas partilhamos um bocadinho mais de nós mesmos e depois... vemo-las partir sem saber quando as vamos reencontrar, mas com a certeza de que quando isso acontecer será uma alegria imensa para ambos. Pensava nisto enquanto me dirigia para o carro à saída da festa de despedida do italiano mais "figo" que conheço (tradução: bonito e simpático). Como ele tantos outros se preparam para partir, e eu não estou assim tão longe. No carro ouço "I wish you were here" dos Pink Floyd e vens-me automaticamente à cabeça; penso em como te enganaste a ler-me, como percebeste mal a minha forma de reagir e como escapaste quando te sentiste confuso em vez de estares comigo e dar-nos a possibilidade de pensarmos juntos. Vou cantarolando a música e reparo que já não sinto tanto a tua falta. Não quero sentir, porque tenho pessoas a ir embora com quem quero aproveitar estes doces momentos sem sentir a tua sombra.

Nos últimos dias tenho-me dedicado a actualizar o meu CV e a descrever em detalhe as minhas tarefas, responsabilidades e as minhas maiores realizações. É um trabalho habitualmente aborrecido, mas tem-me ajudado a relembrar todas as coisas que fiz, que aprendi e que vivi nos últimos anos. Demasiada informação para um potencial empregador, mas uma dádiva de confiança e harmonia para mim. Sim, tenho algumas histórias giras para contar, cada uma delas gravada na minha personalidade e talentos (skills, melhor dizendo). Esta combinação de eventos - a celebração do fim de uma experiência temporária mas intensa e a chatice necessária da procura de emprego - acabaram por me fazer voltar a acreditar que tenho, e continuarei a ter, uma vida fantástica, mesmo sem ti.

quarta-feira, 31 de agosto de 2011

Hoje sinto-me assim

http://www.youtube.com/watch?v=zG16eqK9LL0

Mas depois de um dia intenso de trabalho e uns movimentos de Tai-Chi ao pôr-do-sol junto ao lago, consigo mandar estes feelings dar uma volta para outro lado.

segunda-feira, 29 de agosto de 2011

Às vezes vem às 6,

outras vezes vem às 6h30 e outras ainda perto das 7h. Não há horário certo para os comboios que passam por Ispra carregando mercadorias para e da Suíça. Muitas das pessoas que trabalham no JRC, como eu, precisam de passar pela linha de comboio para ir para casa. De vez em quando somos obrigados a esperar quase meia-hora porque o guarda da estação decide fechar a cancela 20 minutos antes do comboio vir (sabe-se lá porquê). Hoje foi um desses dias. Uma fila interminável de carros esperava pela cancela aberta e nós ciclistas, à chapa do sol, aglomerámo-nos mesmo em frente aos carris prontos a escapar logo que possível. Alguns perderam a paciência e passaram com a cancela fechada. Quando esta abriu, quase meia-hora e algumas asneiras depois, um enxame de veículos de duas rodas passou velozmente, tal a impaciência que nos atingia. Eu acho que o guarda gosta de se rir às gargalhadas com a nossa figura, especados em frente à cancela; é um teste à nossa paciência ou simplesmente para nos aborrecer, a nós estrangeiros coloridos que ocupamos grande parte da sua vila. Haja paciência, porque justificação para tanta demora não consigo encontrar.

segunda-feira, 15 de agosto de 2011

Nos últimos dias

cada dia tem sido bom. Momentos de família; abraços apertados de amigos que não via há muito tempo. Boa música portuguesa, cantando Linhas cruzadas dos Virgem Suta, participando no Movimento Perpétuo Associativo dos Deolinda, descobrindo As vidas dos outros dos Anaquim e recordando o Mais vale nunca dos GNR. O pão com chouriço da meia-noite. Pessoas da terra, juntas debaixo de chuva. Momentos de família, almoços prolongados, brincadeiras com o cão e os gatos. Tem sido bom, apesar de não ter sido planeado assim. Quando a vida nos muda os planos ao improviso mais vale apreciar o que restou. Mais tarde se pensará nas razões destas mudanças e na utilidade da experiência.

http://www.youtube.com/watch?v=rz7Giz9clMM

http://www.youtube.com/watch?v=K9K86B4v3g8

http://www.youtube.com/watch?v=616Seui29G0&ob=av2n

http://www.youtube.com/watch?v=oPqVhpQ0U5k&feature=related

sexta-feira, 12 de agosto de 2011

Detesto ver a desilusão

nos olhos de quem amo. Ver o brilho nos olhos apagar-se por algo que me envolve mas que eu não pude evitar. Detesto que tomem decisões (também) sobre mim sem mim, como se eu fosse um fantoche às mãos do destino e da vontade de outros. Detesto que me ignorem por não terem coragem de assumir as suas escolhas ou para se sentirem melhor consigo mesmos evitando pensar no assunto. Detesto a cobardia e a falta de sensibilidade para lidar com os sentimentos de outros que partilharam pedaços da sua vida. Detesto tudo isto em dobro quando foi provocado por alguém em quem eu confiava plenamente. E detesto-me um bocadinho a mim própria por não me ter apercebido a tempo.
Felizmente o universo, mesmo nas situações detestáveis, arranja maneira de nos acalmar. Neste caso com um atraso inesperado de um voo para África que me permitiu passar uns dias bons, apesar da tempestade da minha vida, daqueles dias onde a amizade sincera nos afasta os tormentos da alma com gargalhadas improvisadas (imaginando cenários em que o causador da tormenta sofre as mais hilariantes desventuras) e nos enche de esperança que o sol brilhe um bocadinho mais no dia seguinte. Obrigada D., por estes momentos de salvação.

quinta-feira, 7 de julho de 2011

Habemus Papam

é um filme italiano realizado por Nanni Moretti que tive a sorte de ver hoje num cinema ao ar livre.

http://www.habemuspapam.it/

Conhecido pelo seu olhar irónico e argumentos algo neuróticos, Nanni Moretti também faz de actor e desenvolve o papel do grande psicanalista que é chamado para ajudar o recém-eleito Papa. Um Papa com sérias dúvidas sobre a sua capacidade de gerir tamanha responsabilidade, demonstrando uma humildade e fragilidade típicas do ser humano. Neste filme divertido e irónico, os cardeais do Concílio jogam às cartas, lidam com as suas mazelas de saúde, fazem puzzles e participam num torneio de voleibol, enquanto o Papa vagueia pelas ruas de Roma, fugido dos seus segurancas, tentando desvendar o caminho a seguir. Uma sátira muito bem conseguida sobre aquilo que nos une a todos, independentemente da posicao que assumimos na sociedade: a nossa humanidade.

terça-feira, 28 de junho de 2011

O espírito "Leve leve"


é uma das características mais evidentes de São Tomé e Príncipe. "Devagar, devagarinho", explicaram-me logo os são-tomenses que me abordaram no aeroporto. Em São Tomé reina a tranquilidade, apesar dos problemas estruturais do país. Um dos países mais pequenos do mundo, com cerca de 160 mil habitantes em menos de 1000 km2 divididos por ilhas, São Tomé beneficia de uma localização privilegiada mesmo à beirinha do Equador. Por isso, pelo clima e pela geologia, a terra é fértil, a floresta densa e as praias extensas, luminosas e bordejadas de coqueiros. Os são-tomenses são extremamente gentis e educados, muito hospitaleiros. Há até quem diga que os são-tomenses são uma espécie de portugueses mais exagerados, para o bem e para o mal: mais hospitaleiros e mais simpaticos, mas também mais formais e mais "deixa andar". Os são-tomenses adoram o seu país, chamam-lhe o paraíso no centro do mundo. E têm razões para isso. São Tomé é África, exuberante e colorida, naturalmente rica e humanamente desigual. E ao mesmo tempo com uma pitada (grande) da cultura portuguesa, na comida, na arquitectura, na maneira de agir. Uma experiência muito enriquecedora e inesquecível.

Marcas da presença portuguesa na cidade de São Tomé


A cidade de São Tomé tem estradas e edifícios razoavelmente cuidados, uma marginal longa e limpa, alguns cafés engraçados, como o Avenida, o Papa-figo e o Passante, a padaria Moderna com croissants quentinhos, restaurantes no Parque Popular onde servem feijão à moda da terra e frango assado, acompanhado de música ao vivo (Kizomba, claro!). Tem mercados caóticos, Hiaces amarelas como táxis e motoqueiros (ou mota-táxi). Tem 2 ou 3 hotéis de alto gabarito explorados maioritariamente pelo Grupo Pestana e uma fábrica de chocolate propriedade de um agrónomo italiano - Claudio Corallo, cujo cacau proveniente da sua plantação em Príncipe é transformado em chocolate gourmet exportado para lojas específicas na Europa, como o El Corte Ingles.


Saindo da cidade, o panorama muda. Barracos de madeira construídos sobre estacas concentram-se à beira das estradas esburacadas, onde correm crianças quase nuas, porcos e galinhas por entre bananeiras. Roupas coloridas são estendidas ao sol, trazidas à cabeça pelas mulheres depois da lavagem nos rios. As antigas plantações de cacau - as Roças, revelam uma atmosfera de abandono e de sobrevivência escassa, entre obras de importância arquitectónica e histórica (hospitais e senzalas).

 
Na Roça de Água Izé. O antigo hospital, um projecto arquitectónico de valor ao abandono


As praias são naturalmente bonitas, de águas cristalinas e ouriços-do-mar nas rochas, mas recentemente despojadas de areia que serve para a construção. Na floresta equatorial prolifera a temida cobra negra, de mordidela mortal. Nada que impeca os mais corajosos de as apanharem (apetrechados de botas de borracha e catana) para aproveitar a sua banha para medicamentos para o reumatismo. A caminho recolhem o sumo de palma, que em poucas horas se transforma em bebida extremamente alcoolica.


Na cascata de Bombaim

Na Roça de Bombaim

Praia de rocha em Água Izé

Boca do Inferno

Pico do Cão Grande, uma intrusão de fonolito, rocha muito resistente, numa chaminé vulcânica de basalto, mais vulnerável à erosão. O basalto desaparece e o fonolito mantêm-se, imponente. As palmeiras que bordejavam o pico foram recentemente cortadas. 


No Ilhéu das Rolas, onde passa a linha do Equador

No centro do mundo, com um pé em cada hemisfério. O pé direito no Sul, para dar sorte.